Apresentação
Gonçalo Pescada: Intuição
Um acordeão conteporâneo
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. . . . . . . . . . .Do clássico
ao popular, passando por Bach e Astor Piazzolla, o Acordeão de Gonçalo Pescada percorre
todos os estilos, fruindo uma intuição própria para a música de todos os géneros,
interpretada num acordeão ousado, contemporâneo e eclético.
É precisamente com o grande mestre do tango conteporêneo, Astor Piazzolla, que
Gonçalo Pescada abre este seu registo de estreia a solo - interpretando
"Revirado", uma peça da linhagem do novo tango, outrora controverso, de um dos
maiores mestres do fole, de todos os tempos.
"Fuga XVII" é o segundo tema do disco, de Joan Sebastian Bach - onde
o acordeão de Gonçalo Pescada constrói uma visão contrapontística a 4 vozes, jogando
precisamente com as entradas e saídas, ao jeito da tradição coral.
"Passos" de Viktor Vlassov é, de seguida, servido em tom de Jazz e
numa versão improvisada sobre um baixo que se repete. E logo a seguir, "Garota de
Ipanema", de Tom Jobim, é mostrada numa versão densa e fazendo vislumbrar uma
garota alternativa e de porte.
"Paraphrase" marca o regresso à loucura contemporânea russa, um tema
do mesmo Viktor Vlassov, que permite a Gonçalo Pescada uma interpretação virtuosa,
profunda e com um certo carácter orquestral. Sem perder o seu estilo denso, o tema
seguinte - "Shoking Valse", de Claude Thomain - deambula entre a graciosidade de
outros tempos e uma certa visão livre, jazzística, contemporânea e alternativa deste
acordeão endiabrado.
Nas mãos de Gonçalo Pescada, a peça que se segue - "Astúrias", de
Isac Aléniz - faz também lembrar a ambiência de um concerto de Órgão de Tubos. Tendo
sido originalmente escrita para piano e tendo também ganho espaço na guitarra clássica
- o tema aparece aqui numa outra dimensão, transformando as mesmas paisagem musicais
espanholas, descritas na peça original.
Logo de seguida, surge o divertido tema "Cowboy", que nos coloca no
meio de cenários do Oeste Americano, um tema curiosamente escrito pelo russo Vyacheslav
Chernikov, retratando uma américa em tom de banda sonora de filme mudo - ambiente, de
resto, bem recriado na interpretação de Gonçalo Pescada.
Em contraste com toda euforia, "Aria - Suite Nº 3", de Bach, retoma o
tom solene e versátil do acordeão, neste caso, colocando-nos dentro de uma versão
"realejo" da obra de Bach - resultando, por isso mesmo, numa interpretação
brilhante.
O tema "Song for Joss", executado com todas as influências do Jazz,
da Bossa Nova e do Baião, apresenta-nos um Gonçalo Pescada num novo patamar de liberdade
interpretativa, mostrando a sua versatilidade rítmica, aliada à leveza das nuvens da
melodia de Richard Galliano.
De regresso à aventura das transformações, Gonçalo Pescada recorre, no tema
seguinte, a uma Sonata escrita originalmente para Cravo - de Domenico Scarlatti (Sonata em
Mi Menor) - eliminando todas as dúvidas sobre a forma como um acordeão pode, de forma
abrangente, criar muitas das sensações da música escrita para vários instrumentos.
O potencial de Gonçalo Pescada vai então ganhando novas dimensões através
dos temas "Fugitivo" de Joaquim Raposo e o grande "Libertango" de
Astor Piazzolla. O autor português - Joaquim Raposo - faz parte de uma nova geração de
compositores portugueses de acordeão - que neste exemplo busca na música de cariz
popular a raiz de uma diversão rítmica assoladora. Por outro lado, o tema de Astor
Piazola, que fora originalmente escrito para vários instrumentos num contexto de música
de cãmara - aqui mantém toda a sua forma, tocada a duas mãos, endiabradas.
O disco fecha com dois temas de colorações bem diferentes. Enquanto
"Divertimento", de André Astler, nos remete para os ambientes dos Cabarets
parisienses, o derradeiro tema do disco é uma belíssima interpretação do
"Verão" de António Vivaldi, uma peça escrita para orquestra e onde Gonçalo
Pescada aplica uma curiosa técnica de articulação do fole ("Bellow Shake")
para ilustrar o papel do arco nos instrumentos de cordas.
Gonçalo Pescada estreia-se a solo com um trabalho a atravessar estilos e
repertórios, colocando ao centro toda a versatilidade do músico e do instrumento - na
interpretação de repertórios e de múltiplas sensasões.