Pais Basco
Kepa Junkera
Maren e os foles do InfernoPor João Maia
Já está entre nós 'Maren', o último trabalho do basco
Kepa Junkera, mestre da trikitixa - acordeão diatónico basco e cujo nome significa 'Fole
do Inferno'. Este é um trabalho quase exclusivamente dedicado ao mar e à importância
que este representa nas tradições do país basco.
O Mar e o fole infernal
Muita da inspiração de Kepa neste trabalho provém essencialmente das áreas
costeiras da sua terra natal, nomeadamente a zona da Biscaia e a reserva de Urdaibai, o
que está bem patente não só no design do disco, mas também na apresentação
multimedia nele contida (que inclui um belo vídeo do tema 'Bok Espok'). Apesar da sua
preocupação com a tradição do seu país, Kepa, como é seu hábito, volta neste
trabalho à intenção de, através da música, juntar tradições e culturas distintas,
ao convidar grupos de vozes búlgaras (Bulgarka Junior), e albanesas (Tirana). Desta
forma, este disco pode ser considerado um disco do país basco, com uma piscadela de olho
ao leste Europeu.
E o primeiro tema do álbum exemplifica esta união na perfeição: 'Bok Espok',
um tema que Kepa escreveu com o contributo dos suecos Hedningarna, e que integrou no seu
trabalho anterior ('Bilbao 00:00'), aparece aqui com uma nova roupagem, um tanto ou quanto
comercial por causa da batida pop, mas que acaba por funcionar bem essencialmente devido
à incorporação dos grupos de vozes de leste. Outros temas em que se conjugam quase na
perfeição estas duas culturas, e que estão claramente entre os melhores do álbum, são
'Busturiko Vikingoak', 'Urdaibai', e 'Oliene', estes menos comerciais do que o primeiro.
Mas as colaborações de Kepa não se ficam por aqui. O músico volta a contar
com a sua banda (Angel Unzu, Blas Fernandez, Harkaitz Martinez, Igor Otxoa e o venezuelano
Julio Andrade), mas convida também outros nomes. O asturiano Hevia, com a sua gaita midi;
Gilles Chabenat que toca sanfona em alguns temas, a catalã Maria del Mar Bonet, na voz e
Ibon Koteron na alboka (clarinete basco) são alguns dos muitos músicos que dão também
uma contribuição muito válida. E claro, não podemos esquecer o músico Justin Vali, de
Madagascar, tocador de "valiha" (uma espécie de harpa), e com quem Kepa forjou
uma grande amizade desde as suas primeiras colaborações.
Este disco padece apenas de um problema, como aliás parece acontecer com todos
os discos de Kepa Junkera. É que quem já teve a oportunidade de ver o músico actuar ao
vivo, sente claramente que um registo discográfico não é suficiente para conter toda a
sua genialidade. Quem pensa que conhece a música de Kepa Junkera apenas por ouvir os seus
discos, enquanto não assistir a um concerto não será nunca capaz de perceber o
carácter dinâmico que tem a sua música, que é constantemente reinventada e alterada
nas suas actuações ao vivo, e sempre com resultados sensacionais.
Quem já se deixou enfeitiçar pelo fole do inferno anteriormente, nomeadamente
através do último álbum de Kepa, o genial duplo 'Bilbao 00:00', imaginaria que, ao
partir para este 'Maren', imediatemente o músico se depararia com um problema. Embora
todos os trabalhos anteriores do músico fossem de elevada qualidade, 'Bilbao 00:00' foi
reconhecido pela crítica internacional da especialidade como um dos melhores álbuns na
área da música de raiz tradicional, não só por juntar um conjunto invejável de
músicos, mas também pela enorme qualidade dos temas. A questão que se colocava agora
era: como dar continuidade a este trabalho ? A fasquia havia sido colocada bem alta,
porém uma vez mais Kepa conseguiu superá-la com distinção. Muitos parabéns. João Maia