Lançamento
A Biografia da Guitarra
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. . . . . . . . . . . . . . Vários
mestres da guitarra portuguesa a acompanhar outros tantos ícones do fado estão reunidos
nesta "Biografia da Guitarra" - um disco dedicado à Guitarra Portuguesa de
Lisboa e à alma portuguesa do Fado cantado em Lisboa, ao longo dos tempos.
Fontes Rocha, António Chaínho, Armandinho, Carlos Paredes, Raul Nery, Alcino
Frazão, Maria Teresa de Noronha, Amália, Camané ou Vicente da Câmara são apenas
alguns dos nomes que fazem parte deste disco, onde os grandes mestres se cruzam com
algumas das maiores vozes de sempre do Fado, em obras clássicas e imortais.
Em Biografia da Guitarra mostram-se as duas vertentes da Guitarra Portuguesa de Lisboa (a
de Coimbra, seguir-se-á num próximo volume): as guitarradas, onde o
guitarrista pode dar largas à sua técnica e imaginação, criando as chamadas
variações; e o o acompanhamento, onde o guitarrista, estando
atento ao poema, à letra, ao estilo e até à intensidade da voz do intérprete, pode e
deve ajudá-lo.
Parte da série Biografias, este CD trata-se sobretudo de uma introdução a um
instrumento ligado de forma tão íntima ao fado e à alma portuguesa.
Breve História da Guitarra Portuguesa
A Guitarra Portuguesa actual resulta do aperfeiçoamento da Cítara
Europeia (instrumento introduzido em Portugal na 2ª metade do século XVI, vindo de
Itália ou da Flandres e já difundido em meios populares nos finais do século XVII) e da
sua fusão com a Guitarra Inglesa (parente daquela mas aperfeiçoada em
Inglaterra e introduzida em Portugal na 2ª metade do século XVIII pela colónia inglesa
do Porto).
A ligação da guitarra ao Fado só é conhecida a partir da 2ª metade do
século XIX, numa altura em que a Cítara Popular já teria caído em desuso e
a chamada Guitarra Inglesa ainda soaria nos salões da Lisboa Romântica.
Até esta altura, o Fado seria acompanhado pela Viola de Cinco Ordens de
Arame, instrumento popular muito em voga, com exemplares típicos em todas as
regiões, e que teria estado na origem de algumas fórmulas de acompanhamento
herdadas pela guitarra.
A repetição das fórmulas de acompanhamento por tocadores de várias
gerações acaba por constituir um vocabulário da guitarra de fado com
estereótipos de acompanhamento que são um dos seus elementos de
identificação.
Este instrumento, de sonoridade emotiva, adapta-se com facilidade à dolência do fado e o
seu acasalamento com a viola (Guitarra Clássica ou Guitarra
Espanhola) é perfeito.
Armandinho (1891-1946) é um marco na execução da guitarra portuguesa, criando
escola onde se vão filiar outros grandes nomes, merecendo, a meu ver,
destaque especial Jaime Santos, Raul Nery, José Nunes e Fontes Rocha.
Jaime Santos é autor de inúmeros fados e variações, sendo-lhe característica a sua
notável execução mecânica, criando uma escola muito particular.
José Nunes, oriundo do Porto e inspirado nos trinados nostálgicos de
Armandinho, no convívio com Salvador Freire e na técnica de Artur Paredes (notável
guitarrista de Coimbra que estará em particular destaque num 2º volume que dedicaremos
à Guitarra de Coimbra), cria uma nova escola em que, tirando partido das cordas bordões,
exprime uma mágoa ímpar através de gemidos e glissandos muito
próprios.
Raul Nery, exímio acompanhador e também discípulo de Armandinho, com um ferir de corda
e um som inconfundíveis, a par de uma garra excepcional, forma com Fontes
Rocha, Júlio Gomes e Joel Pina o célebre Conjunto de Guitarras de Raul Nery,
a junção perfeita de quatro excelentes artistas. O Conjunto de Raul Nery chega a criar
com a própria melodia e com o intérprete (Fernando Farinha e Maria Teresa de Noronha,
por exemplo), um todo tão perfeito que não se imagina outro acompanhamento.
Fontes Rocha vai para o Embuçado nos finais dos anos 60, ao mesmo tempo que,
juntamente com Carlos Gonçalves (guitarra), Pedro Leal (viola) e Joel Pina (viola baixo)
acompanha Amália Rodrigues. É nesta época que Alain Oulman produz muita música para os
versos de poetas como David Mourão-Ferreira e Pedro Homem de Mello. Essas músicas são
depois arranjadas por Fontes Rocha que lhes faz introduções e
ornamentos que não se podem mais dissociar das músicas originais. Além
disso, obtém, usando uma guitarra de Coimbra com a afinação de Lisboa (ver
nota), efeitos que valorizam o acompanhamento para aquele tipo de música e para as
interpretações de Amália. Podendo considerar-se um discípulo de Armandinho, Fontes
Rocha é também o criador duma Nova Escola, que se caracteriza pela
simplicidade, pelo gosto e pelo partido que se tira da guitarra nas suas mais variadas
vertentes. É também autor musical de inúmeros fados.
Raul Nery, Jaime Santos e Francisco Carvalhinho são, a meu ver, responsáveis por
estereótipos de acompanhamento que, pela sua beleza, expressão e apoio ao
intérprete vocal, ficaram como sinais de identificação inconfundíveis.
A BIOGRAFIA DA GUITARRA está longe de concluída. A simples existência hoje de
instrumentistas como Fontes Rocha, Mário Pacheco, Ricardo Rocha, Pedro Caldeira Cabral,
António Chaínho, Paulo Parreira, Custódio Castelo ou José Manuel Neto para só
citar alguns é boa prova de que a história não acaba aqui. E não se surpreenda
quem notar neste disco a ausência de alguns deles (ou de outros, estejam eles ou não em
actividade). Trata-se dum 1º volume, que só pode ser entendido como uma introdução.
Note-se, por fim, a inclusão neste disco do inclassificável Carlos Paredes,
demasiado heterodoxo para o podermos classificar apenas de Coimbra ou de
Lisboa, embora a ambas pertença. Vindo na linha de seu pai, Artur Paredes, e dotado
de um talento ímpar, ele dá uma nova dimensão à guitarra portuguesa, criando e
executando peças de rara beleza e de uma técnica excepcional. A ele se deve a
universalização da guitarra portuguesa e a sua música vem estimular toda uma nova
geração.
Três Breves Explicações
Procurou-se nesta BIOGRAFIA DA GUITARRA mostrar as duas vertentes da
Guitarra Portuguesa de Lisboa:
- As guitarradas, onde o guitarrista pode dar largas à sua técnica
e imaginação, criando as chamadas variações.
- O acompanhamento, onde o guitarrista, estando atento ao poema, à
letra, ao estilo e até à intensidade da voz do intérprete, pode e deve
ajudá-lo.
É pela mão do Professor Martinho dAssunção que a viola evolui
consideravelmente, dando sempre o suporte rítmico e harmónico à guitarra mas dialogando
com esta e permitindo ao guitarrista ter mais espaço para as suas
divagações musicais.
Artur Paredes resolve por volta de 1945, juntamente com o construtor de
guitarras João Pedro Grácio, criar aquela que passará a ser conhecida como a
Guitarra de Coimbra (à qual será dedicado o segundo volume de
BIOGRAFIA DA GUITARRA), distinguindo-se da de Lisboa por ter a ilharga
alteada, escala alongada de 23 pontos e afinar-se um tom abaixo da de Lisboa, com cordas
de calibre apropriado. Algumas modificações feitas na construção desta são depois
aplicadas também na construção da Guitarra de Lisboa, que passa a
beneficiar de qualidades acústicas bem melhores do que até ali.