Oeiras
Cramol
A voz como instrumento
Oeiras,
Auditório Eunice Muñoz, 18 de Dezembro 2004, 21:30h
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Texto publicado no 30 Dias da
Câmara Municipal de Oeiras
Nascido na sequência de uma oficina de
aprendizagem de canto tradicional, o Cramol faz agora 25 anos. Na sua longa existência,
contam-se muitas histórias em torno do canto e da tradição portuguesa. Dia 18, em
Oeiras, revistam o passado e o futuro.
Em Outubro de 1979, um grupo de quinze jovens mulheres decide aprender, aprofundar e
reencontrar-se num canto rural de estilo arcaico e de distintas sonoridades que a
diversidade paisagística do país moldou em cada região. Um quarto de século depois, o
núcleo inicial mantém-se quase inalterado, apesar das idas e vindas a que o tempo e a
vida foram obrigando. Já foram 22, ou mesmo 25. Hoje, estão 18 no activo.
Neste seu já longo percurso, o Cramol teve o privilégio de partilhar palcos e estúdios,
dentro e fora de portas, com muita gente da música, do teatro, da dança, do cinema e
até mesmo das artes plásticas.
Para o espectáculo que assinala os seus 25 anos de existência, o Cramol convida três
grandes nomes da música com os quais, apesar da amizade, da cumplicidade ou da empatia,
ainda não tinha, enquanto grupo, tido o prazer de cantar. São eles, Amélia Muge, uma
das nossas maiores cantoras, autoras, compositoras e intérpretes, dona de uma voz e
criatividade ímpares; Uxia, a cantora galega mais portuguesa que afirmam conhecer,
detentora de enorme sensibilidade e de um talento e força invulgares; e Moçoilas, um
grupo algarvio de mulheres que desenvolve um trabalho de pesquisa e de divulgação
original de um repertório regional pouco conhecido. Um espectáculo certamente a não
perder e para o qual a entrada é livre.
Margarida Antunes da Silva
Elemento do Cramol
Como nasceu o Cramol?
O Cramol nasceu em
Outubro de 1979 na sequência de uma oficina de aprendizagem de canto tradicional de
mulheres (polifonias e monodias de diferentes regiões de Portugal). Essa aprendizagem
incidia não apenas no (re)descobrir de um vasto repertório como ainda de uma sonoridade,
que é distinta de região para região. Essa diferente sonoridade tem a ver com um
quotidiano rural e a relação directa com a natureza e o seu ciclo e a paisagem
influenciou seguramente a forma como a voz era projectada sobretudo nas tarefas
ou celebrações ao ar livre.
Por que razão está sediado na Biblioteca Operária
Oeirense?
O Cramol está sediado na Biblioteca Operária
Oeirense porque foi nessa associação que nós iniciámos o nosso trabalho. A oficina que
atrás referi teve aí lugar. Nessa altura, todas nós pertencíamos a um outro coro misto
que era também uma das múltiplas actividades da associação. Aliás, nessa altura
existia aquilo a que chamámos Grupo de Música Activa da BOO, que incluía, para além
destes, um outro grupo vocal e instrumental. Para nós, a ligação à BOO é extremamente
importante porque nos permite nunca perder de vista o estar e partilhar com os outros, os
saberes e as descobertas e também porque nos sentimos lá bem. Ela faz parte das nossas
vidas.
Que apoios têm tido ao longo da vossa existência?
Tem havido dois ou três tipos de apoio.
Comecemos por aquele que, para além das nossas vontades, nos permitiu existir e não
desistir, perseguindo sempre a mesma busca: o da família (os maridos, os filhos, os pais)
e dos amigos. Nessa altura, algumas de nós tinham filhos pequenos e só com esse apoio
que era também um incentivo era possível encontrarmo-nos regularmente para ensaios e
também espectáculos (já foram muitas centenas...). O outro foi o de pessoas que com a
sua cumplicidade, o seu olhar atento e sabedor, nos incentivaram (entre outros, o Ernesto
Veiga de Oliveira, o Francisco dOrey, a Margot Dias, o Benjamin Enes Pereira e o
Domingos Morais) a perseguir no caminho da qualidade. Por último, mas não menos
importante, o financeiro, que nos permite pagar a alguém para trabalhar connosco. Esse
devemo-lo, em primeiro lugar, à CMO, através de um subsídio mensal atribuído à
Associação para as suas actividades culturais (entre as quais o Cramol), ou através de
um subsídio para a indumentária. Para além disso, recebemos ainda pontualmente um
subsídio, para uma deslocação a Londres (Conway Hall), da Secretaria de Estado da
Cooperação da altura (1982), e um outro do Gabinete de Relações Internacionais do
Ministério da Cultura (2001) para a nossa deslocação a um festival em Barcelona (Teatre
Ovidi Montlor). No estrangeiro ainda estivemos no Théâtre de la Ville em Paris (1986),
na Holanda (Amsterdam e Rotterdam - 1991), Frankfurt (Bockenheimer Depot, 1987) e Rennes
(França, 1997) mas a expensas dos organizadores. De resto... ainda hoje nos quotizamos!
25 anos é muito tempo?
25 anos é sobretudo
coisa rara num grupo com as nossas características. Mas respondendo à pergunta, é muito
se o considerarmos na dimensão espaço/tempo. É pouco, naquilo que esse espaço/tempo
nos tem trazido de aprendizagem e enriquecimento, de procura interior, de descoberta
constante, de partilha, de convívio, de amizade, de encontros, de trocas de
experiências, de cruzamentos com outras formas musicais e com outras culturas. Tem sido
tão rico esse tempo que queremos mais. Aliás, o espectáculo que assinala os nossos 25
anos, é mais um momento de encontro onde se efectivam cumplicidades, dentro e fora de
portas, desta vez com Amélia Muge, Uxia, uma das cantoras mais significativas da Galiza,
e as Moçoilas (Algarve).