Crónica
Vários minutos de Silêncio
na música portuguesa
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. . . . . . . . . .Os músicos
portugueses querem ser ouvidos - não por governos ou promotores - mas sim através das
rádios e das televisões. Na verdade, as quotas de transmissão da música portuguesa nos
media estão longe de serem cumpridas...
As operadoras de rádio-difusão estão obrigadas, por lei, a incluir nos seus
programas musicais 50% de produção portuguesa e de portugueses. Na verdade, poucos
cumprem a lei e, com isso, são os criativos nacionais que perdem. A excepção à regra
é a RDP, sobretudo atreavés do seu 1º canal.
Anualmente, em portugal distribuiem-se vários milhões de euros em direitos de
autor, que vão directamente para as contas de artistas estrangeiros, que de resto ocupam
largamente o espectro audio-visual no nosso país. Muitas dessas verbas, por direito
legal, deveriam estar a fomentar o mercado criativo nacional; através da remuneração
das obras dos autores portugueses, quando difundidas nas rádios e nas televisões.
Igualmente curioso é o desempenho comercial de alguns artistas portugueses
além fronteiras, vendendo centenas de milhares de discos - ficando-se, comparativamente,
por uns modestos 5 ou 10 mil discos vendidos no nosso país. Aparentemente, estes números
fazem crer que a música Portuguesa não é do interesse dos portugueses, ou simplesmente
não é ouvida em Portugal.
A rádio em números
Falando dos números de 2002, temos que a RDP - Antena 1 deverá estar a passar perto de
70 a 80 por cento de música portuguesa. No caso da Antena 3, a música nacional ocupa
entre 25 e 30% (à quinta-feira, a estação só toca música nacional).
No caso da Rádio Renascença, temos 42,7% de música portuguesa, significando
um decréscimo de 16,6%, face a 2001. A RFM, em 2002, passou apenas 9,4%, tendo em 2002
aumentado em 56,7% a presença da música portuguesa na sua programação. A Rádio
Comercial fica-se pelos 13,2%, registando também um aumento de 9,1% face a 2001.
No caso da Comercial e da RFM, 2002 significou uma maior escolha pela produção
nacional, provavelmente motivada pela concorrência do Canal 3 da RDP - que, ao
reformular-se, fez uma aposta na música moderna portuguesa.
Olhando ainda para o caso da Rádio Cidade, a música portuguesa ocupa apenas
5,5% da programação daquela estação, significando uma variação negativa de 42,1%
face a 2001.
Apesar de haver algumas estações com uma expressiva aposta na música
portuguesa, os números das audiências fazem crer que a música nacional é menos ouvida
do que aquilo que propõe a lei. No conjunto de todas as rádios nacionais, a música
feita no nosso país ocupa cerca de 20% da programação. Considerando as audiências das
várias estações, a música portuguesa tem um peso relativo de apenas 25%.
As audiências das estações de rádio, que apostam maioritariamente na música
nacional, não registam, necessariamente, índices de audiências mais baixos. No caso do
Canal 1 da Rádio Renascença, com 42,7% de Música portuguesa, a estação ocupa o 2º
lugar nas audiências.
Entre as muitas rádios locais espalhadas pelo país, pouco se sabe em termos de
cumprimento da lei, mas o certo é que muitos casos têm circulado sobre alegadas
cobranças por parte das estações locais para levar artistas nacionais à antena.
Especula-se também sobre lobys comerciais junto das rádios nacionais, para influenciar
aquilo que deve ou não passar nas emissões. Tudo situações que contribuem para
instalar um clima de desconfiança e de desinvestimento por parte dos criadores.
Por outro lado, também há o caso de pequenas estações, que têm de enfrentar
outra dificuldade: o difícil acesso ao material promocional dos projectos nacionais.
Muitas rádios têm de adquirir os discos; só que há muitos que não chegam a sair dos
circutos de distribuição dos grandes centros hurbanos. Conclusão: o problema está
longe de ser simples, mesmo para quem quer cumprir a lei.
A Televisão por um canudo
No caso dos quatro canais generalistas de Televisão a ausência de música
portuguesa é quase total, sendo, de resto, muito poucos os programas dedicados a temas
músicais. Como tudo, há também excepções, que acabam por confirmar a regra.
Dado o impacto que o audiovisual representa no conhecimento público dos
projectos musicais nacionais, este estado das coisas acaba por ter o efeito mais
prejudicial para os artistas portugueses. Entre guerras de audiências e uma programação
populista, a música ocupa um lugar de segundo plano, onde a informação cultural nas
televisões, nos chamados horários nobres, é praticamente ausente.
Dêem-lhes ouvidos
É neste estado de espírito que surge um movimento entre os músicos, que querem
ver alterada a ordem das coisas e fazer com que, pelo menos, se cumpra a lei - a par do
papel de alertar a sociedade e os poderes públicos para a actual situação. "Venham
mais cinco" é a designação da plataforma, que ganhará estatuto de
associação e que fará a representação de um vasto número de músicos portugueses,
impulsionadores e aderentes desta iniciativa.
Mas, na verdade, os músicos portugueses não querem ser ouvidos só porque a
lei assim determina. O facto é que acreditam que as forças e os interesses comerciais
estabelecidos previligiam massivamente outros produtos, deixando de lado os criadores
nacionais. Só que, alegam, a música produzida no nosso país não está a conseguir
sobreviver no actual cenário.
De acordo com vários músicos e produtores, o público raramente chega a ter
contacto com uma grande parte da produção musical portuguesa; fazendo, de resto, com que
esta não apareça no leque das escolhas dos portuguesas. José Miguel
Fonte estatística: Music Control (empresa responsável pela monitorização de
16 estações de rádio 24 horas por dia), 2003