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Caretos ainda tentam salvar aldeias dos castigos do além

João José Branco (Correspondente do Jornal de Notícias)

Nos dias de hoje já não há acontecimento social, em Macedo de Cavaleiros, em que não tenham de intervir os caretos de Podence. O fenómeno acontece desde o início da década, na sequência do interesse de vários estudiosos portugueses e estrangeiros em investigar as origens e os rituais das máscaras transmontanas, cuja intervenção continua a constituir uma das tradições mais singulares do país.

Apesar da sua mística estar mais relacionada com o Carnaval, há quem veja no aparecimento dos caretos de Podence uma espécie de retoma da Festa dos Rapazes, que se realiza no domingo, pelo calendário religioso dedicado a Santo Estevão. O palco são aldeias do concelho de Bragança, nomeadamente Aveleda e Varje. Até à década de 40, também teve lugar nas aldeias de Ousilhão e Vila Boa de Ousilhão, no concelho de Vinhais, por alturas da "Festa da Mesa".

Nos últimos tempos, as figuras dos caretos têm sido alvo da curiosidade do público em geral e, em particular, de alguns pintores e artesãos transmontanos.

Graça Morais pintou 12 quartos alusivos aos caretos de Podence e António dos Santos Silva expôs, no passado mês de Março, no Museu Abada de Baçal, em Bragança, 74 quadros e personagens mascaradas.

Também os artesãos, como João Manuel Esteves e José David Afonso, de Ousilhão e Vila Boa de Ousilhão, respectivamente, ainda mantém a tradição e, todos os anos, fazem novas máscaras.

A tradição dos caretos de Podence esteve interrompida nas décadas de 60 e 70, coincidindo precisamente com o maior fluxo de emigração, sobretudo para França. Contudo, nas aldeias a norte do distrito, os usos e costumes dos mascarados sempre foram estritamente respeitados.

Desde logo, -por radicarem na "Festa dos Rapazes", cujo culto a Santo Estevão é sentido quase como obrigação pelos habitantes das aldeias.

Há diversas interpretações para este tipo de comportamento. Uma delas tem a ver com a virilidade masculina. É o caso das "mouricadas" (simulação de lutas entre mouros e cristãos) ou do "chocalhar", em que os rapazes tocam as moças com chocalhos, presos ao cinturão que lhes segura as vestes tecidas de lã e coloridas em tons verde, vermelho e amarelo.

Ao mesmo tempo, exibem danças e soltam cavernosos sons como se os caretos tivessem entrado em transe ou estivessem apoderados por estranhas personagens.

Na verdade, a escolha deste período para as festas pode estar relacionado com o facto de, antigamente, se associar a época natalícia à ocorrência de factores considerados então sobrenaturais, como o solestício do Inverno, em que os dias começam a ser maiores e as noites a decrescer.
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